Marlene Cristina Medeiros da Silva Soares


A LITERATURA INFANTIL NA ABORDAGEM DA CULTURA AFRO-BRASILEIRA NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL


Introdução
Para nos compreendermos enquanto sociedade múltipla e diversa, devemos começar pela educação e, nesse sentido, faz-se extremamente importante uma boa preparação, tão necessária ao desempenho do papel docente produtivo e capaz de mudar paradigmas que inicia-se com a graduação e prossegue por toda a sua vida acadêmica.

A abordagem dos temas de cultura e da história africana e afro brasileira são um exemplo claro e clássico desta dificuldade oriunda do preconceito histórico quanto a tudo o que se refere ao continente africano.

Neste artigo, constituído a partir da coleta de dados em uma pesquisa ação, procuramos trabalhar a temática das culturas africana e afro brasileira com uma turma do sexto semestre do curso de Pedagogia - sendo o trabalho desenvolvido durante as aulas da disciplina de Conteúdos, Metodologias e Práticas de História - da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Penápolis,FAFIPE -instituição mantida pela Fundação Educacional de Penápolis, FUNEPE – utilizando a literatura como instrumento facilitador na sensibilização para o tema e subsequente elaboração de metodologias de ensino adequadas ao trabalho com  com alunos das séries iniciais do ensino fundamental.As atividades ocorreram no segundo semestre de 2017, na cidade de Penápolis/SP.

O Brasil nasceu na África
A construção da nação brasileira, iniciada séculos atrás, passa pela utilização de mão de obra de indivíduos africanos escravizados e trazidos ao Brasil de diversas origens, como ressalta Fausto (2013, p. 47):

“Costuma-se dividir os povos africanos em dois grandes ramos étnicos: os sudaneses, predominantes na África Ocidental, Sudão egípcio e na costa norte do golfo da Guiné, e os bantos, da África equatorial e tropical, de parte do golfo da Guiné, do Congo, Angola e Moçambique.”

Apesar desta informação, para Munanga (2009, p. 92), “os processos de mestiçagem e empréstimos culturais entre africanos escravizados no Brasil tornam difícil, se não impossível, discernir e identificar a origem étnica das populações afrodescendentes do Brasil de hoje.”

Além de diversos, foram muitos, como esclarece o livro “O povo brasileiro”: “calculo que o Brasil, no seu fazimento, gastou cerca de 12 milhões de negros, desgastados como a principal força de trabalho de tudo o que se produziu aqui e de tudo que aqui se edificou.” Ribeiro (2006, p. 203).

Para compreendermos a sociedade complexa e múltipla oriunda de todas essas interações com os demais povos que compões a base da nação brasileira,
faz-se necessário que promovamos ações pedagógicas, enquanto professores, e nos demais âmbitos da sociedade, enquanto cidadãos,para que compreendamos e busquemos soluções para os problemas do país.

A tradição oral africana continua na escrita
Para Aguèssy (1980, p. 108), “em primeiro lugar, lembramos que uma das características das culturas africanas tradicionais, a sua característica fundamental, é a oralidade”, e é essa oralidade que serve de veículo para o contar histórias, base fundamental da transmissão de valores, leis, costumes, ética e entretenimento muito comum em todo o continente africano e uma das finalidades e razões de ser e existir da literatura.

Desta maneira, com baixo custo, a tradição oral africana tornou-se popular, e, como ressalta Leite (2012, p. 20) “a predominância da oralidade em África é resultante de condições materiais e históricas”, ainda que não fosse a única forma de transmissão de conteúdos e ideias, como sublinha Aguèssy (1980, p. 108), pois “quando falamos de oralidade como característica do campo cultural africano, pensamos numa dominante e não numa exclusividade.”

Sendo assim, “essa ideia de herança oral, radicada nos mestres africanos, os griots, vai levar a criar uma noção de continuidade entre a tradição oral e a literatura africana” (LEITE, 2012, p. 18).

Vemos, assim, que contar histórias, é uma manifestação tradicional da cultura em várias partes da África pois, por exemplo, como ressalta Machado (2014. p. 32) “lá em Angola, os Quiocos, são famosos por serem um povo muito contador de histórias”, sempre se utilizoude recursos amplos e diversos, sendo renovado ao longo do tempo, aos quais se juntou a literatura.

Literatura esta que tem o poder de nos ensinar, impulsionar e transformar pois, “graças a ela, somos mais e somos outros, sem deixar de ser nós mesmos” e, ainda, “a literatura estende a vida humana”, (VARGAS LLOSA, 2004, p. 29.

Se pode a oralidade se manter como veículo tão forte e, por tanto tempo, de transmissão de conteúdo, não poderia a mesma, aliada à literatura, servir como adjuvante no aperfeiçoamento da formação de professores?

Esse adjuvante, aqui exemplificado na forma de elaboração de instrumento pedagógico para o trabalho com as culturas africanas e afro-brasileiras em sala de aula, deve fazer parte de todo um movimento maior em busca de mudanças sociais pois, como observa Holanda (1995, p. 178):

“A experiência já tem mostrado largamente como a pura e simples substituição dos detentores do poder público é um remédio aleatório, quando não precedida e até certo ponto determinada por transformações complexas e verdadeiramente estruturais na vida da sociedade.”

África e Literatura: duas respostas para várias perguntas
A pergunta norteadora deste trabalho é: como atuar na formação de Pedagogos para que estes abordem a temática das culturas africana e afro brasileira, em sala de aula, nas séries iniciais do ensino fundamental?

A partir de 2003, de acordo com a lei nº 10.639, foi obrigatório o ensino da temática História e Cultura Afro Brasileira, especialmente no âmbito da Educação Artística, da Literatura e da História Brasileiras. Porém, esta lei deixou de ter validade a partir de da lei nº 13.415, de 2017.

Assim, as iniciativas impulsionadas pela lei que constituíram motivo de empolgação e alguns avanços, para Serrano (2010, p. 15) “os progressos alcançados não negam que muito há de ser feito e realizado nesse campo” e acabaram prejudicadas com a mudança na legislação.

Deste modo, optamos por desenvolver este projeto a partir de uma pesquisa-ação com o uso de livros de literatura infantil de temática africana e afro brasileira que trabalhassem com temas como preconceito, identidade e diferenças.

Propusemos às alunas do curso de Pedagogia que, divididas em grupos, escolhessem um livro do referido tema para trabalhar bem como qual a abordagem quisessem propor para desenvolver o trabalho a partir de cada história.

Os grupos deveriam criar um método de trabalho para ser aplicado com as turmas com as quais estiveram desenvolvendo as atividades do estágio supervisionado.

Para colocar em pratica tais métodos, as alunas escolheriam se utilizar, por exemplo, de materiais recicláveis e/ou sucata e materiais artísticos.

Posteriormente, as futuras Pedagogas deveriam produzir uma narrativa como relato das experiências resultantes das atividades informando como foi recebida a proposta de trabalho com as crianças, tanto pela escola quanto pelas mesmas, as dificuldades encontradas na operacionalização das tarefas e os resultados obtidos.

Além disso, em momento futuro, em sala de aula, todas deveriam socializar seus relatos.Dentro do escopo de atuação como docente do ensino superior, a realização desse trabalho buscou despertar a sensibilidade das alunas do curso de Pedagogia para o trabalho com a temática das culturas africana e afro brasileiras, por meio da literatura infantil de temática africana e/ou afro brasileira.

Conhecer, debater e refletir sobre obras de literatura infantil de autores brasileiros e também de autores do continente africano que abordassem temas como preconceito, medo e estranhamento quanto ao diferente e compreensão e aceitação da própria identidade foi a meta estabelecida como ponto de partida para esta trabalho.

Experimentar diferentes abordagens como contação de história, oficinas de arte e pintura, com uso de sucata e material reciclável, que pudessem instrumentalizar a obra literária escolhida de maneira livre, criativa e com baixo custo foram opções levantadas em conjunto com as graduandas para que estas pudessem fazer suas escolhas de como abordar os temas.

Assim, a abordagem referente às história e cultura africanas e afro brasileiras, mais que um atendimento ao disposto na lei 10.639/03, que, infelizmente, perdeu a validade, constitui importante esforço no enfrentamento a mazelas tão presentes em nossa sociedade já que, para Nascimento (2012, p. 33):

“Não é de hoje que a educação vem sendo considerada, pelos atores da luta contra o racismo, como um espaço estratégico de atuação, pois, dentro deste espaço, se reproduz o modelo de educação fundado nos valores civilizatórios ocidentais, numa perspectiva hegemônica, negando a diversidade existente na sociedade brasileira, produzindo, assim, uma ideologia de inferiorização das civilizações africanas...”

Abordar esta temática constitui um esforço por um espaço escolar inclusivo, pois:

“A escola é um dos espaços de socialização dos indivíduos. É através dela que os alunos desenvolvem o senso crítico e aprendem valores éticos e morais que regem a sociedade. A sociedade tem como responsabilidade ampliar os horizontes culturais e expectativas dos alunos numa perspectiva multicultural. É na escola que aprendemos a conviver com as diferentes formas de agir, pensar e se relacionar; portanto, ela deve refletir essa diversidade (NASCIMENTO, 2012, p. 40).”

Sendo a escola, um dos lugares que prepara os alunos para a vida, faz-se necessário uma mudança nesse sentido e, para isto:

“O sistema educacional brasileiro precisa considerar esses elementos como essenciais na formação das crianças e jovens, pois a escola, enquanto espaço plural e diverso necessita construir pressupostos teóricos que reconheçam e dialoguem com a diversidade cultural presente na sociedade, enriquecendo, assim, o cotidiano escolar e formando cidadãos atuantes e cientes do seu papel social, indivíduos que tem por princípio o respeito às diferenças e compreendam que a humanidade é diversa (NASCIMENTO, cap. 2, 2012, p. 43).”

A especificidade da literatura infantil faz necessário que nos detenhamos um momento para refletir que este tipo de obra não possui apenas o caráter instrutivo, pois:

“Implica que toda e qualquer narrativa que apresente alta densidade estética traz aprendizagens, seja no campo da ética, da afetividade ou do conhecimento. Aprendizagens que a criança carregará para o resto da vida, amalgamadas em sua personalidade, mesmo que já adulta não recorde nem mesmo uma linha desta ou daquela história. Essa é a natureza pedagógica que a literatura traz em si (SOUZA, 2010, p. 18).”

A instituição, o curso, a disciplina
A Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Penápolis é mantida, a nível municipal, pela Fundação Educacional de Penápolis, entidade fundada em 28 de maio de 1966 e que passou ao status de Instituição Pública Direito Privado por meio do Estatuto aprovado em Assembleia Geral em 15 de maio de 2017.

Localizada na Avenida São José, 400, Vila Martins, em Penápolis – cidade localizada a quatrocentos e noventa quilômetros de distância da capital do estado e que, de acordo com a estimativa do censo de 2016, conta com 82 406 habitantes -, em termos de estrutura física, a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Penápolis conta com treze prédios onde estão distribuídas vinte e oito salas de aula além de uma quadra poliesportiva.

O curso de Licenciatura em Pedagogia tem duração de sete semestres sendo as aulas ministradas no período noturno.

A matriz curricular privilegia o trabalho docente que dialogue com outras áreas do conhecimento bem como com a realidade do futuro docente de forma humanística e atualizada.

A disciplina na qual foram realizadas as atividades da pesquisa é Conteúdos, Metodologias e Práticas da História com duas aulas semanais, perfazendo um total de 40 horas/aula semestrais.

Em linhas gerais, o objetivo da disciplina é tornar possível que os futuros professores possam utilizar os instrumentos de análise histórica para a compreensão da realidade social amparada pelas atividades realizadas em sala que se embasam na bibliografia.

A experiência
Com orientação do professor responsável pelaturma, apresentamos a sugestão de atividade, bem como alguns livros que poderiam ser utilizados na elaboração das atividades, como descreve plano de aula anexo.

Ao apresentar as obras percebemos que várias alunas não estavam familiarizadas com algumas obras da literatura de temática africana e afro brasileira, ou mesmo com autores deste contexto e mesmo com algumas obras que tratam da questão do preconceito.

Outras obras e autores, no entanto, já eram conhecidos mas, segundo reflexão das próprias alunas, estas nunca os tinham analisado sob o viés da proposta inicial deste trabalho.

Concluídas as discussões, as alunas, divididas em grupos, escolheram três livros, sendo:
- As tranças de Bintou, de autoria da escritora franco-senegalesa Sylviane Anna Diouf, que fala sobre Bintou, uma menina africana que quer usar tranças, como suas irmãs mais velhas, mas tem que se contentar com os cabelos arrumados em birotes, como é tradição entre seu povo. O tema identidade foi ressaltado nesta obra;

- A galinha preta, escrito pela alemã Martina Schlossmacher, que conta a história da galinha Preta que botava ovos de diferentes formatos e, por isso, era discriminada pelas outras galinhas, mas vê seu destino mudar ao ser levada para o castelo do rei. Propõe uma reflexão sobre diferenças;

- O amigo do rei, da brasileira Ruth Rocha que se passa na época em que havia escravidão no Brasil e que fala da amizade entre dois meninos, um negro escravo do outro, branco. O menino negro, filho de um rei africano, sempre dizia ao seu senhor e amigo, que um dia seria rei também.É uma história que tenta falar de forma leve sobre o triste período da escravidão no Brasil.

Leitura e análise das obras
Antes do trabalho com as obras literárias escolhidas, o professor responsável pela disciplina introduziu um texto, com posterior debate, com vistas ao esclarecimento, à reflexão e aos debates sobre conceitos que seriam importantes durante as atividades.

O texto apresentado pelo professor foi Uma abordagem conceitual das noções de raça, racismo, identidade e etnia, de autoria do Professor Doutor Kabengele Munanga, da Universidade de São Paulo - USP, onde discorre sobre a origem de conceitos como raça e racismo bem como caracteriza etnia e identidade.

Concluído esse trabalho teórico, passamos à leitura e discussão sobre cada uma das obras literárias escolhidas para as atividades afim de tornar possível identificar onde estavam os pontos de interesse dentro da temática proposta para o trabalho.

A fim de melhor ordenar e orientar o entendimento da sequência das atividades, tomo aqui a liberdade de identificar os grupos por códigos de acordo com a obra literária utilizada e o tema a ser abordado nas atividades, a saber:

- Grupo 1 (G1): livro o amigo do rei, as influências africanas na cultura brasileira;
- Grupo 2 (G2): livro as tranças de Bintou, identidade, influências da cultura africana no Brasil;
- Grupo 3 (G3): livro a galinha preta, identidade, inclusão, racismo.


Definição da metodologia utilizada
Identificados os temas,cada grupo elegeu uma metodologia de trabalho para aplicar as atividades em sala de aula com as crianças.

Ficou definido como segue:

- G1: este grupo optou por realizar a atividade realizando a leitura do livro para a turma com posterior roda e conversa e execução da brincadeira “Escravos de Jó”;
- G2: na atividade desse grupo foi realizada a leitura do livro, uma roda de conversa e a confecção de uma boneca articulada da personagem do livro por meio de pintura, recorte e colagem;

- G3: após leitura do livro e roda de conversa, este grupo orientou os alunos a, em duplas, desenharem um retrato do seu colega.

Execução das atividades e relatos dos resultados
A seguir apresento os relatos de cada grupo sobre a execução das respectivas atividades:

- G1: a atividade deste grupo foi realizada em uma escola municipal de ensino fundamental da cidade de Penápolis, com uma turma do 5º ano do ensino fundamental I.

As atividades escolhidas por este grupo foram a leitura do livro “o amigo do rei”com subsequente roda de conversa para falar sobre as influências e heranças dos povos africanos na cultura brasileira, e no cotidiano dos alunos. Como exemplo dessa herança, o grupo propôs a realização da brincadeira “escravos de Jó” que, tradicionalmente, é conhecida como uma brincadeira de origem africana.

No relatório da atividade apresentado pelo grupo, a proposta de atividade foi bem recebida pela direção da escola e pela professora responsável pela turma, e despertou entusiasmo nos alunos.

Como turma do 5º ano eles estavam agitados e foi preciso organizar a empolgação para que a atividade fluísse adequadamente.

As integrantes deste grupo que, durante a leitura do livro os alunos interagiram e fizeram perguntas adicionando histórias da própria família durante a roda de conversa. A turma foi dividida em grupos menores para a brincadeira “escravos de Jó” e para facilitar a administração da atividade.

Os recursos utilizados pelas graduandas para o desenvolvimento da atividade com os alunos foram: o livro “o amigo do rei”, lousa, giz e copinhos descartáveis para a brincadeira “escravos de Jó”.

Finalmente, o grupo ressaltou o interesse dos alunos pelo assunto gerando identificação dos alunos com o tema

- G2: as atividades deste grupo também foram realizadas em uma escola que atende alunos do ensino fundamental I, com uma turma do 4º ano, no município de Penápolis.

Ao longo da leitura da obra “as tranças de Bintou” e posterior debate outras descobertas foram surgindo, o que deixou os alunos empolgados para a realização da atividade.

Para a realização da atividade foram necessários os seguintes materiais: lápis de cor, canetinhas coloridas, tesouras, barbante colorido na cor preta, cola, uma folha de papel em branco e outra com o desenho da personagem Bintou.

Os alunos foram orientados a pintar as partes do corpo e roupas da personagem, recortar as partes separadamente e, posteriormente, remontá-la em outra folha de papel, de gramatura maior com a utilização de cola.Os cabelos da personagem foram confeccionados com pequenos caracóis de barbante e colados sobre o desenho, de modo a formar os birotes do cabelo da personagem.

No relato o grupo refere que a atividade foi realizada com êxito e destaca a identificação que várias meninas da turma sentiram com a história do penteado da personagem Bintou.

- G3: os trabalhos deste grupo foram realizados em uma escola do ensino fundamental I, no município de Penápolis, com uma turma do 5º ano.
Refere o relato das graduandas a boa recepção que tiveram por parte da equipe escolar e dos alunos.

O relatório descreve que durante o levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos, foi perguntado a estes se tinham familiaridade ou conheciam termos como “preconceito”. Alguns alunos disseram já ter ouvido falar nestes termos, outros não. Alguns relataram já ter sido vítimas de preconceito.

Foi feita a leitura de “a galinha preta” com posterior debate e os alunos foram estimulados a falar sobre as diferenças que nos caracterizam como pessoas.

Para a atividade a ser realizada pelos alunos os materiais utilizados foram papel em branco, lápis preto e lápis de cor.

A tarefa consistiu em, formadas duplas, que cada aluno ou aluna desenhasse seu parceiro ou sua parceira destacando características que fosse a diferença e a qualidade de cada um.

No relatório as graduandas trazem impressões positivas das atividades junto às crianças. A noção que os alunos tem de que não se deve desrespeitar outras pessoas por conta de suas características diferentes como a cor da pele, a textura dos cabelos ou alguma deficiência que a pessoa possua.

Socialização dos resultados em sala de aula
De volta à sala de aula com as graduandas, nas dependências da FAFIPE/FUNEPE, de posse dos relatórios finais de suas atividades, foi possível um momento de troca e reflexão.

Foi retomado o texto do Professor Doutor Kabengele Munanga a partir do qual as alunas de Pedagogia refletiram que a hierarquização das raças e/ou etnias é danosa, pois coloca algumas pessoas em posição de superioridade diante de outras o que dá origem a conflitos e, expostas as crianças desde pequenas a esse conceito, contribui para a formação de uma sociedade desigual e injusta.

As experiências que deram origem ao presente artigo foram consideradas positivas pelas alunas que, de maneira unânime, referiram ter aprendido muito seja conhecendo novos autores, seja ampliando a visão sobre conceitos de cultura e história africana e afro-brasileiras.

Considerações finais
Como trabalho que pretende contribuir para um processo de mudança de mentalidades positivamente, esta é uma modesta contribuição, pois é assim que grandes e duradouras mudanças acontecem: aos poucos. E ainda que seja uma pequena contribuição, o presente artigo oferece uma esperança de que é possível melhorar a educação brasileira. Sobretudo a educação no tocante a questões étnico-raciais, identitárias e de direitos humanos.

O resultado mais nobre, talvez, seja a possibilidade de instrumentalizar melhor os professores em sua formação básica e continuada, o que deve ser considerado com seriedade pelos gestores da educação. Sobretudo os gestores da educação de interesse público, como é o caso das escolas onde as atividades foram realizadas pelas graduandas em Pedagogia. Preparar melhor o professor da escola pública consiste em oferecer ao aluno desta escola uma formação mais completa, mais democrática que tanto falta nas nossas escolas.

Na iminência de vermos solapada a educação integral e cidadã dos alunos da escola pública em decorrência de reformas arbitrárias e equivocadas no sistema de ensino público, se faz urgente que, enquanto professores, nos posicionemos contrários a tudo isso. Também é necessário que advoguemos, por meio do trabalho docente de qualidade, em favor de uma formação humanística,que possibilite a consolidação de valores caros que deram origem à nossa Constituição Federal como igualdade, fraternidade e liberdade, na formação do cidadão brasileiro pleno de seus direitos e deveres.

O trabalho integrado das instituições de ensino, como foi possível por meio da interação entre as alunas do curso de Pedagogia da FAFIPE/FUNEPE e as crianças do ensino fundamental público da cidade de Penápolis, é importante elemento nessa cadeia de esforços pela formação mais completa dos futuros docentes que se verão de posse de um arcabouço muito maior de instrumentos durante o exercício do seu trabalho.

O presente trabalho é resultado, também, dessa interação e cooperação entre instituições de ensino e evidencia a essência intercambiável do conhecimento, esse elemento essencial para a construção de uma sociedade saudável, justa e equânime. Sendo assim, o conhecimento que não deve permanecer parado ou em poder de um pequeno e restrito grupo de indivíduos, deve ser acessível, livre e enriquecido à medida em que muda de mãos.

Referências
Marlene Cristina Medeiros da Silva Sores, historiadora, especialista em Docência no Ensino Superior e Técnico pelo Centro Universitário Toledo – Araçatuba/SP

Orientadora: Angela Inês Libertatti, pedagoga e historiadora, mestra e doutoranda em Ciência Política pela USP. Coordenadora do curso de Licenciatura em História do Centro Universitário Toledo – Araçatuba/SP.

AGUÈSSY, Honorat. Visões e percepções tradicionais. In: Introdução à cultura africana. Lisboa: Edições 70, 1980.


BRASIL, lei nº 10.369 de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências. Brasília, DF, jan. 2003.

BRASIL, lei nº 13.415 de 16 de fevereiro de 2017. Altera as Leis nos 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e 11.494, de 20 de junho 2007, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, e o Decreto-Lei no 236, de 28 de fevereiro de 1967; revoga a Lei no 11.161, de 5 de agosto de 2005; e institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral. Brasília, DF, fev. 2017.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. 14. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2013.

LEITE, Ana Mafalda. Oralidades e escritas pós-coloniais: estudos sobre literaturas africanas. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2012.

MACHADO, Ana Maria. Histórias africanas. São Paulo: FTD, 2014.

MUNANGA, Kabengele. Origens africanas do Brasil contemporâneo: histórias, línguas, culturas e civilizações. São Paulo: Global, 2009.

NASCIMENTO, Elisa Larkin (org.). Cultura em movimento: matrizes africanas e ativismo negro no Brasil. São Paulo: Selo Negro, 2008.

SERRANO, Carlos; WALDMAN, Maurício. Memória D’África: a temática africana na sala de aula. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2010.

SOUZA, Ana A. Arguelho de. Literatura infantil na escola: a leitura em sala de aula. Campinas: Autores Associados, 2010.

VARGAS LLOSA, Mario. A verdade das mentiras. São Paulo: ARX, 2004.



2 comentários:

  1. Boa tarde.
    Gostei muito dessa ideia de trabalhar a cultura afro-brasileira a partir de livros de literatura infantil, não sendo restrito o trabalho dessa temática apenas aos livros didáticos. Tendo em vista o seu estudo, você acredita que essa abordagem também poderia ser aplicada à educação infantil?
    Karoliny Silene Silva Matos

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  2. Você acha que seu trabalho poderia ser utilizado para outros campos de pesquisas da mesma temática?

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