Janaina Cardoso de Mello


ENSINO DE HISTÓRIA E GESTÃO DO PATRIMÔNIO NATURAL

 “Moro num país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza.”
(Jorge Ben Jor)

O Ensino de História requer o diálogo com outras áreas de conhecimento capazes de contextualizar a presença social de homens e mulheres no tempo e no espaço de convívio. O olhar da História, enquanto disciplina, para outros estudos têm recebido o nome de interdisciplinaridade, multidisciplinaridade ou transdisciplinaridade, dependendo do nível de interação entre as interpretações e seus estudiosos. Sob esse aspecto, o Ensino de História e Patrimônio Cultural, tendo como foco o Patrimônio Natural, coloca em cena áreas do conhecimento como Ciências e Geografia.

Do final do século XX às primeiras décadas do século XXI trouxe os temas do aquecimento global, dos derretimentos das calotas polares, da poluição de rios, mares e do próprio ar que respiramos, com maior intensidade. Compartilhar conhecimentos com as novas gerações demanda pensar e planejar um futuro e este só se tornará possível quando se debater com seriedade a responsabilidade humana na gestão dos recursos naturais (425 reservas da biosfera em 95 países).

O Programa MAB – O homem e a biosfera, desenvolvido pela Unesco, em1971, já preconizava a necessidade de: 1) conservar os recursos genéticos, espécies, ecossistemas e paisagens; 2) estimular o desenvolvimento sustentável, social e econômico; 3) apoiar projetos demonstrativos, de pesquisa e educação, na área de meio ambiente.

Em 1972, a UNESCO produziu um documento oriundo da “Convenção para a proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural” realizada em Paris, França. Todavia, somente em 2016 foi publicado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) o “Manual de Referência Gestão do Patrimônio Mundial Natural”. Esse grande hiato temporal demonstra a complexidade de lidar com a temática do ambiente em um mundo onde indústrias cada vez mais globalizadas produzem lixo e deterioração da fauna e da flora.

O Manual de Referência Gestão do Patrimônio Mundial Natural teve como propósito ajudar a gerir os valores naturais dos bens do Patrimônio Mundial, sendo que estes correspondem a apenas um por cento da superfície terrestre. Isto posto que, a inclusão de um bem natural na Lista do Patrimônio Mundial é feita com base em uma declaração de que se trata de um lugar especial de Valor Universal Excepcional (VUE). De acordo com as Diretrizes Operacionais de 2005, parágrafos 77-79:

"Para ser considerado de Valor Universal Excepcional, um bem deve cumprir as condições de integridade e autenticidade, e deve contar com um sistema de gestão e proteção adequado para garantir sua salvaguarda (UNESCO/IPHAN, 2016:39)"

Nesse rol de patrimônios naturais de excepcional valor estão: formações físicas, geológicas e biológicas, com áreas ocupadas por espécies diversas de animais e vegetações, com valor científico e estético. Para além das aulas de Geografia Física e suas definições de biomas naturais (Amazônia, Caatinga, Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica e Pampa) o Ensino de História e Patrimônio Natural pressupõe investigar o histórico das ações humanas de depredações ao longo do tempo, os impactos da degradação ambiental na vida cotidiana e formas de gestão e salvaguarda que permitam uma reconciliação com a natureza e assim, o prolongamento da vida na terra.

Por Gestão do Patrimônio Natural, entende-se a capacidade física, financeira, política e prática de assegurar a manutenção de assegurar a manutenção desses valores (patrimônio natural/mundial) perpetuamente. E dentre os benefícios da patrimonialização de áreas ambientais estão:

*Participação em uma rede global de sítios de Patrimônio Mundial natural.
*Oportunidades de se beneficiar de treinamentos, cursos e oficinas direcionadas treinamentos, cursos e oficinas direcionadas a gestores e equipes do Patrimônio Mundial.
* Acesso a unidades de apoio na sede da UNESCO, em Paris, na França, e sede da UICN em Gland, na Suíça, bem como a escritórios regionais e comissões/redes, incluindo as Comissões Nacionais da UNESCO e a Comissão Mundial de Áreas Protegidas da UICN.

Na atualidade existem sete patrimônios naturais brasileiros reconhecidos pela UNESCO: Cataratas do Iguaçu - PR (tombamento em 1986), Mata Atlântica – SP e PR (tombamento em 1999), Parque Nacional de Monte Pascoal – BA e ES (tombamento em 1999), Complexo de Áreas Protegidas da Amazônia Central – Anavilhanas (tombamento em 2000), Pantanal – MT e MS (tombamento em 2000), Fernando de Noronha – PE (tombamento em 2001), Chapada dos Veadeiros – GO (tombamento em 2001). Ressaltam-se ainda os Biomas Costeiros com uma extensão de aproximadamente 8.500 km, Ecossistemas ao longo do litoral, Costões rochosos, Dunas e Restinga.

Ao planejar uma aula com base no planejamento da gestão do patrimônio natural, primeiro deve-se ter em mente o ambiente ao redor da escola e dos bairros de residência dos alunos. Pesquisas em jornais, utilizando o acesso à internet via smartphones e computadores dos laboratórios escolares resultará no acondicionamento de dados que podem ser comparados com outras geografias ou escalonados em uma “Linha do Tempo” do próprio local (município ou estado) demonstrando as mudanças antes e depois do nascimento dos alunos. Pois, "A ciência histórica está enraizada na vida humana concreta (onde se localizam os seus fundamentos e critérios de racionalidade) e a essa deve voltar (RÜSEN,2001, p.22; 2007, p.16)".

Tal proposta remonta às ideias de Jörn Rüsen para quem a História deve ser percebida e ensinada como uma ciência ligada ao cotidiano, uma vez que ao “agir no mundo o homem precisa interpretá-lo, não como um dado puro, mas à luz de suas memórias e experiências”.

A elaboração de fichas digitais para compartilhamento via Whatsapp ou Facebook da disciplina devem conter: a Identificação do patrimônio natural (definição), o registro e a avaliação de suas condições (localização e estado de conservação), propondo políticas de salvaguarda/conservação e gestão. Gerar a responsabilidade e o uso da criatividade na proposição de soluções para os problemas encontrados fazem da aula de História um espaço de inovação que gera impacto social na comunidade local.

A partir dos dados obtidos na pesquisa e de sua sistematização, os alunos sob a orientação de seu professor, podem criar vídeos com seus celulares (utilizando editores de imagem e som simplificados como o Windows Movie Maker) postando-os no YouTube; podem ainda elaborar QR Codes impressos em etiquetas que podem ser dispostas pela escola e pelo bairro, direcionando seu acesso à blogs onde as propostas de proteção do patrimônio natural sejam disponibilizadas ou criar esquetes teatrais que podem ser apresentadas nas quadras das escolas e em praças públicas do bairro.

Apps Conexão Natureza no Ensino de História e Patrimônio Natural.
O uso da tecnologia de aplicativos (Apps) para smartphones no Ensino de História e Patrimônio Natural tem se revelado um importante instrumento pedagógico no acesso às gerações mais novas. Manuseando dispositivos móveis com conectividade, cada vez mais cedo crianças e adolescentes aprendem não somente a buscar informações como a produzir os apps que as disseminam. Tornam-se assim de aprendizes, à pesquisadores e vetores de suas elaborações no campo da informática. Por isso, antes de solicitar que o aluno desligue o celular e não o use em aula, os professores desse contexto de Educação 3.0 necessitam “reaprender a ensinar”, ou seja, aprender a usar esses recursos digitais que em muito têm superado quadros de giz e aulas expositivas.
Por isso, para o trabalho com apps de conexão com a natureza que envolvem conhecimentos multidisciplinares e a própria noção de gestão ambiental, uma atenção especial deve ser dada aos softwares: Futuro em suas mãos (produção e rentabilidade, sem prejudicar o meio ambiente); Meu ambiente (denúncias de crimes ambientais); Catálogo de Madeiras Brasileiras (para arquitetos e engenheiros para arquitetos e engenheiros para arquitetos e engenheiros para que queiram usar madeiras menos conhecidas em seus conhecidas projetos – WWF/Brasil);  Pesca Mais (monitorar populações de peixes); Biomas Mundiais (monitorando clima e geografia); Ecossistemas Brasileiros (com projetos educacionais e uso de QR Code); Geo Challenge APK (com mapas e escalas, climas e biomas, bacias hidrográficas e recursos naturais). Chama-se a atenção para o game “SOS Biomas APK” (onde o usuário deve apagar incêndios, libertar os animais ameaçados de extinção e coletar castanha-do-Pará).

No que diz respeito aos apps especificamente voltados para o patrimônio mundial é pertinente trabalhar com: Patrimônio Mundial da UNESCO – Full (desenvolvido na România, por Radu Savutiu, no formato de uma enciclopédia digital, com textos, imagens e geolocalização via Google Maps com download na Google Play Store) e  World Heritage Sites (desenvolvido em San Diego – CA, por TripBucket, no formato do Google Maps).

Posteriormente ao uso dos aplicativos referenciados acima como lócus de ensino, os alunos podem desenvolver seus próprios aplicativos com temáticas voltadas para suas localidades a partir de programas gratuitos como o MAKRApp.

Campanhas de conscientização com a associação dos moradores, feiras de bairro e organizações de trabalhadores (desde agentes da limpeza urbana até comerciantes) tornam os alunos protagonistas da socialização do conhecimento construído coletivamente na escola e que não deve se manter atrás de seus muros, uma vez que diz respeito à melhor qualidade de vida da sociedade circundante.

Mesmo as escolas que não possuem uma boa conexão de internet wifi podem estimular seus alunos a elaborarem croquis de smartphones com o desenho de seus aplicativos detalhados em ícones e funcionalidades, que podem ser apresentados em Seminários de grupos.

As metodologias ativas no Ensino de História fazem com que o aluno, para além do aprendizado, seja um cocriador de conteúdos e um cocriador do compartilhamento desses que podem e devem ser realizados tanto no mundo virtual, quanto no físico.

O patrimônio Natural é parte importante do patrimônio cultural, uma vez que a cultura conduz comportamentos e assim pode fortalecer novos procedimentos de salvaguarda do ambiente no presente e no futuro.

Referências
Janaina Cardoso de Mello é doutora em História Social (UFRJ), professora adjunta do Departamento de História da Universidade Federal de Sergipe (DHI-UFS), do Mestrado Profissional em Ensino de História (ProfHistória/UFS) e do Mestrado Acadêmico em História da Universidade Federal de Alagoas (PPGH-UFAL).

RÜSEN, J. Razão histórica: teoria da história: os fundamentos da ciência histórica. Brasília: UnB, 2001.
RÜSEN, J. História Viva: teoria da história: formas e funções do conhecimento histórico. Brasília: UnB, 2007.
UNESCO. Convention concerning the Protection of the World Cultural and Natural Heritage. (World Heritage Convention). 1972. Disponível em: http://whc.unesco.org/en/conventiontext (English web page), acesso em: 20/01/2019.
UNESCO/IPHAN. Gestão do Patrimônio Mundial cultural. Brasília: UNESCO Brasil, Iphan, 2016. 163 p. (Manual de referência do patrimônio mundial).


Um comentário:

  1. Esta proposta de trabalho poderia ser utilizada de forma mais adequada a quais etapas/anos?
    Fabiana Regina da Silva

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