O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA: HISTÓRIA, A
LEI 10.639/2003, AS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS E A FORMAÇÃO DE
PROFESSORES
Introdução
A Lei 10.639/2003 alterou a Lei de Diretrizes e Bases (Lei
9.394/1996) para incluir nos currículos das escolas o ensino de História e
Cultura Afro-Brasileira. Segundo o decreto, esse conteúdo compreende o “estudo
da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura
negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional” (BRASIL, 2004, p.
35). Dessa forma, será possível resgatar a contribuição do povo negro nas áreas
social, econômica e política da História do Brasil.
Em 2004, o Conselho Nacional de Educação aprovou as
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e
para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (DCN), com
orientações para o estabelecimento da Lei 10.639/2003. As Diretrizes devem ser
observadas pelas instituições de ensino brasileiras, especialmente as de ensino
superior na formação inicial e continuada de professores. Composta por
orientações, princípios e fundamentos voltados ao planejamento, execução e
avaliação da Educação, as DCN buscam “promover a educação de cidadãos atuantes
e conscientes no seio da sociedade multicultural e pluriétnica do Brasil,
buscando relações étnico-sociais positivas, rumo à construção de nação
democrática” (BRASIL, 2004, p. 31). Argumenta-se a necessidade de, além de
reconhecer e valorizar a identidade, história e cultura dos afro-brasileiros,
garantir o reconhecimento e igualdade de valorização das raízes africanas na
formação do Brasil.
As DCN exigem que os sistemas de ensino e seus mantenedores
incentivem e criem condições materiais e financeiras para que a Educação das
Relações Étnico-Raciais seja aplicada, e forneçam às escolas, professores e
alunos materiais bibliográficos e didáticos necessários. Nesse sentido,
enquadra-se o livro ‘Formação de professores: produção e difusão de conteúdos
sobre história e cultura afro-brasileira e africana’, resultado do curso de
mesmo nome, para docentes da rede básica de ensino de Santa Catarina,
organizado pelo Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade do Estado de
Santa Catarina. Iluminados pelas discussões, apresentaremos conceitos
fundamentais para compreensão da sociedade, das relações étnico-raciais nas
escolas, e analisaremos três momentos da história e cultura afro-brasileira,
com perspectivas para compreender a participação e ação das populações negras,
da escravização na África aos desafios modernos.
Discutindo
conceitos para uma mudança de perspectiva
Uma das primeiras ações necessárias para o estudo das
relações étnico-raciais é discutir termos e conceitos fundamentais para
compreender a sociedade em que estamos inseridos. Paulino de Jesus Francisco
Cardoso e Karla Leandro Rascke apresentam os conceitos de raça, negro e
afrodescendente, para “dimensionar as implicações sociais e políticas do seu
uso” (2014, p. 12).
O conceito de raça, embora cientificamente rejeitado, é usado
para produzir distinções. Raça é uma construção social, política e ideológica, firmada
na mentalidade racista e que continua fazendo vítimas. Foi a doutrina
racialista que estabeleceu critérios de beleza e
inteligência a partir do padrão europeu e branco.
Os conceitos de afrodescendentes e população de origem
africana surgiram para enfrentar a noção de raça. Os afrodescendentes são
aqueles que valorizam e identificam-se com sua ascendência africana. Os
equívocos sobre o termo ‘negro’ é um dos que precisam ser desfeitos (BRASIL,
2004), ao se conhecer o processo de construção da identidade negra no Brasil.
De acordo com Cardoso e Rascke (2014), no período escravista, negro era
designativo da condição de pessoa cativa, sendo, enquanto no pós-abolição, com
as teorias raciais, negro passou a significar todos os africanos e seus
descendentes, com associações negativas. Enquanto identidade, é apenas após
ações do Movimento Negro no Brasil, que o termo negro foi ressignificado e
usado na luta política.
Racismo é uma ideologia que afirma a superioridade branca,
“uma rede complexa de atitudes e ações sociais para discriminar negativamente
um grupo social” (CARDOSO & RASCKE, 2014, p. 17). Individual ou
institucional, o racismo é sempre violento, seja física ou simbolicamente.
Outra ideia importante e recorrente é o preconceito racial, uma atitude de
juízo antecipada e negativa sobre determinados grupos. Os estereótipos, ligados
ao campo visual, são explicados como ideias fixas sobre grupos e/ou pessoas que
podem justificar sua opressão ou rejeição. Quanto à discriminação racial, esta
ocorre quando o racismo e o preconceito são postos em ação, negando ao “outro” um
tratamento igualitário.
Cardoso e Rascke (2014) apresentam as ações afirmativas,
medidas que tentam alcançar grupos discriminados e excluídos socialmente,
procurando criar oportunidades para eliminar as desigualdades. No Brasil, destacam-se
as políticas públicas a partir de 2003, que traz mudanças profundas ao ensino
superior. Tais medidas são formas de permitir que homens e mulheres excluídos
socialmente possam galgar novos espaços e sonhar com condições mais dignas.
Percebida como um campo de desigualdade étnico-racial, a
educação brasileira precisa valorizar a diversidade para superá-las (BRASIL,
2004). A partir da diversidade, pensar os sujeitos históricos e os grupos
culturais com um olhar crítico sobre suas vivências, assim como compreender
cada um com suas particularidades e relações, e permitir a cada cidadão o
alcance da cidadania plena, com todos os direitos e oportunidades. Pelo
multiculturalismo, necessita-se reconhecer a multiplicidade de sujeitos
constitutivos em cada espaço em que estamos inseridos, que cada grupo,
notadamente as minorias, tem o direito de preservar suas características
culturais (CARDOSO & RASCKE, 2014).
A escola e a sociedade precisam firmar um compromisso com a
igualdade. É necessário enfrentar os discursos alienantes, que impedem as
pessoas de verem o que acontece no seu cotidiano (CARDOSO & RASCKE, 2014). Ao
ampliar nossas ações e parcerias, criaremos um ambiente em que se altere a
realidade de discriminação nas escolas, privilegiando a história e cultura
africana e afro-brasileira além do mês de novembro, em um novo processo de
reeducação.
Cardoso e Rascke defendem o debate em torno das relações
raciais, da inclusão da participação das populações africanas e seus
descendentes na construção histórica, social e cultural do país, e da
invisibilização e exclusão da população negra no pós-abolição. Frente a isso, a
escola tem o desafio de permitir “que valores culturais e históricos de
diferentes culturas sejam incorporados à prática pedagógica” (2014, p. 26).
Relações
étnico-raciais na escola
Mesmo que não sejam as únicas instituições que devem lutar
contra esses males da nossa sociedade, as escolas são convocadas a serem espaços
democráticos que visam a uma sociedade justa. Sua atuação é imprescindível para
eliminar as discriminações e emancipar os grupos discriminados (BRASIL, 2004).
Nesse sentido, Maristela dos Santos Simão e Angelo Renato Biléssimo (2014)
apresentam subsídios para compreender as relações étnico-raciais na sociedade
brasileira e suas implicações no cotidiano.
Os autores destacam a luta antirracista nos seus diversos
cenários, percebendo as atitudes e comportamentos nos meios de comunicação e
escolas, principais meios de propagação de ideias. Ao investigar as relações
étnico-raciais na mídia, Simão e Biléssimo (2014) verificaram que a figura
negra aparece negativamente, associada às piores condições de trabalho e
moradia, com as grandes conquistas, protagonismo e melhores condições de vida
vinculada a personagens brancos. Também nos livros didáticos, a presença negra
é invisibilizada, sem grandes nomes negros, ou em posições subalternas. Em
ambos os casos, estigmas e estereótipos se repetem indefinidamente. Na
educação, percebe-se que problemas como analfabetismo, evasão escolar e baixa
escolaridade, comparativamente, atingem uma maior parte da população negra. Com
causas complexas e que estendem por vários aspectos da sociedade, são
necessários esforços variados para superá-los, dos quais a Lei 10.639/2003 é
apenas um dos muitos caminhos.
Se a educação é um ambiente de propagação e reiteração de
comportamentos discriminatórios, a perspectiva da educação multicultural faz-se
relevante. Esta permitirá a formação de cidadãos que busquem a justiça social
(SIMÃO & BILÉSSIMO, 2014). Para isso, essa transformação precisa ser
desenvolvida de forma coordenada nas escolas. A educação multicultural vai além
do professor, até às mudanças estruturais, para que os processos de ensino e
aprendizagem respondam positivamente aos desafios presentes. A escola precisa
agir como canal de mudança dessa imagem negativa e excludente. A escola é um
reflexo da sociedade, mas o inverso também é verdadeiro. Não podemos ficar
inertes esperando a mudança da sociedade para que a escola mude, mas
compreender que a escola é um lócus privilegiado para a transformação social.
Por inserirmo-nos na discussão do ensino de História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana nas salas de aula, apresentaremos a partir
de agora temas relativos a esse ensino, com novas formas de encará-los a partir
do reconhecimento da participação e contribuição negra na formação do Brasil,
articulando o passado, presente e futuro na esfera das experiências,
construções e pensamentos produzidos em circunstâncias e realidades distintas
da população negra.
Pensando a
escravidão
Quanto à História da África, as Diretrizes Curriculares
Nacionais determinam uma perspectiva positiva para esse estudo, tratando não
somente da miséria e discriminações que afligem o continente, devendo-se atender
aos tópicos pertinentes em articulação com a história dos afro-brasileiros
(BRASIL, 2004). Nos temas sugeridos, encontra-se o tráfico e escravidão no
ponto de vista dos escravizados, o papel dos europeus, asiáticos e africanos no
tráfico, as relações entre as culturas e as histórias dos povos africanos e na
diáspora. Nessas orientações, Amailton Magno Azevedo e Willian Robson Soares
Lucindo (2014) trazem a revisão historiográfica que sugere entender a
colonização do continente africano não apenas na visão eurocêntrica e perceber
as contribuições dos povos não europeus para a formação das novas sociedades
das Américas e as relações culturais híbridas.
Portugal foi o primeiro país europeu a se lançar à
colonização, procurando crescer seu comércio e propagar o catolicismo, primeiro
na África, e depois nas Índias. Procura-se compreender a colonização no Brasil
não simplesmente como continuidade da expansão portuguesa, mas acontecendo no
circuito do Atlântico Sul, tendo recebido oito vezes mais africanos do que
portugueses. Para os autores, “esse fluxo demográfico permitiu uma renovação
constante das memórias africanas e um prolongamento dos valores e costumes pela
vida social e cultural do Brasil” (2014, p. 142).
A escravidão não pode ser vista nas sociedades africanas com
o mesmo sentido da definida pelos europeus, que alteraram o sistema de
escravização com sua entrada no comércio de pessoas; é “quase impossível
encontrar o mesmo sentido de propriedade escrava da modernidade ocidental, até
o tráfico atlântico” (AZEVEDO & LUCINDO, 2014, p. 145). O modo de produção
escravista, quando as estruturas de uma sociedade incluem um sistema conectado
de escravização, tráfico e uso interno dos cativos, com uma ligação entre
escravização e comércio, entra em cena com os europeus. Até então, a
escravização não era causa de guerras e conflitos, mas subproduto. O surgimento
de novos agentes nos governos e as sociedades escravocratas tiraram a
escravidão da forma marginal para uma instituição fundamental.
Apesar da situação jurídica do escravo, entendido como um
bem móvel, não se pode negar sua condição humana de sujeito escravizado, que
além de usar sua capacidade criativa para suas atividades, procura resistir e
sobreviver. Isso explica as diferentes atribuições e hierarquias que podem ser
encontradas dentro das sociedades em que estavam presentes, pois apesar da
relação de violência e subordinação, os escravizados, como sujeitos, lutaram
por meios de sobrevivência, dentro das possibilidades existentes e nas sociedades
que estavam inseridos (AZEVEDO & LUCINDO, 2014).
Em relação ao Brasil, houveram vários ciclos de saída e
entrada de africanos entre os séculos XVI e XIX, tendo o Rio de Janeiro se
consolidado como o principal porto negreiro. É importante verificar que o
tráfico e a escravidão geraram um conjunto de valores culturais africanos que
impregnou o Brasil, tornando-o mais próximo dos povos africanos do que dos reis
europeus.
Os negros como
agentes históricos no Brasil
Para discutir as experiências das populações de origem
africana no Brasil, entre os séculos XVI a XIX, Claudia Mortari e Fábio Amorim
Vieira (2014), apontam a diversidade de vivências no cativeiro, as identidades,
as solidariedades, a religiosidade e as resistências. Os autores analisam as
vivências dos escravizados como sujeitos e agentes sociais, pois a condição
escrava não significava passividade, e as relações costumeiras entre senhores e
escravos evidencia a existência de negociações.
As populações africanas trazidas ao Brasil tinham as mais
diversas procedências do continente. A noção de cor designava não somente um
grupo racial ou níveis de mestiçagem, mas também seus lugares sociais. Ou seja,
“etnia e condição jurídica eram indissociáveis” (MORTARI & VIEIRA, 2014, p.
171). Os termos definiam sua condição e origem: na maioria das vezes, preto era o africano traficado pelo
Atlântico, sendo na documentação acompanhado da denominação nação, que se relacionava com os portos
de embarque ou identificação dada pelos traficantes.
Mortari e Vieira argumentam que a escravização não anulou os
africanos enquanto sujeitos: a diáspora permitiu fluxos e trocas culturais
através do Atlântico, representando “um processo de redefiniçao social,
cultural e histórica do pertencimento, e implica, para além do deslocamento,
mudança, transformação” (2014, p. 172). A construção ou reinvenção de
identidades e diferenças ocorreu em um processo de transculturação, de troca.
Essa abordagem, segundo os autores, é importante ao considerar a influência
mútua das diferentes culturas, ainda que de forma desigual, como na análise dos
vínculos familiares e de solidariedade que as populações de escravos e libertos
estabeleceram entre si, dentro dos contextos em que estavam inseridas. As
experiências dos homens e mulheres na diáspora africana, entremeadas em
relações e adaptações, permitem pensá-los como sujeitos com posturas sociais,
costumes e práticas culturais que escapavam aos padrões que as classes
dominantes exigiam.
Os caminhos e
lutas no pós-abolição
Jeruse Maria Romão (2014) traça alguns dos caminhos das
populações afrodescendentes após a abolição. O estigma da escravidão continuou
a perseguir as populações de origem africana, mas ainda que impedidos de terem
condições iguais de liberdade, negros e negras buscaram mobilizar-se para
enfrentar e alterar as barreiras na nação brasileira.
Romão combate a Teoria da Democracia Racial, que instituiu a
ideia de que a escravidão brasileira teria sido branda e as relações
escravistas afetuosas. A luta contra o racismo da sociedade implica
reconhecê-lo como parte da cultura brasileira e não simplesmente como um
comportamento individual e não intencional. Pois, se o racismo não é
intencional, não há motivos para o negro reagir, o que também implica na
imposição da aceitação. Procedente dos modelos políticos vigentes, a escola é
espaço da ação pedagógica do branqueamento, pretendendo criar um cidadão com
ideias e comportamentos brancos e inviabilizando a presença negra.
Investigando o século XX, marcado pelo racismo, Romão (2014)
apresenta ações e lutas em busca da igualdade. No Brasil, durante a chamada
primeira fase do movimento negro, as primeiras agremiações de negros lutaram
contra o modelo de segregação brasileiro, pois buscavam ser integrados na
sociedade de classes, exercendo seus direitos cidadãos. Mudanças no movimento
negro vieram com a criação do Teatro Experimental do Negro (TEN), com seu papel
especialmente nos campos das artes e da educação, contestando a ausência do
artista negro causada pelo domínio da estética branca e permitindo que estes
atores assumissem personagens centrais nas artes cênicas. O TEM e diversas
organizações negras desenvolveram experiências educacionais em prol das
populações de origem africana.
Os movimentos musicais da Black Music e a emancipação dos
países africanos influenciam a juventude nas décadas de 1960 e 1970, que
afirmam sua identidade negra, adentrando também nas lutas políticas. Dois
momentos importantes desse período são a movimentação pela criação do Dia da
Consciência Negra e o lançamento do Movimento Negro Unificado. Nas décadas
seguintes, o movimento negro reafirma sua identidade e pluralidade, articulando
a “unidade na diversidade”, defendem suas pautas como políticas públicas,
alcançando o reconhecimento das comunidades remanescentes de quilombos e a
criminalização do racismo como crime inafiançável, e criam redes de apoio às
vítimas de racismo (ROMÃO, 2014).
No século XXI, o governo concretiza políticas públicas
defendidas pelo movimento negro. Destaca-se a Lei 10.639/2003, que abre a
escola como espaço plural e dialógico, valorizando a identidade africana do
brasileiro. Políticas afirmativas para o acesso à educação também são
relevantes, em vista de que a média da presença de negros no ensino superior
era de apenas 2%. Tais medidas são necessárias, pois sem a intervenção do
Estado através de políticas de reparações, os excluídos dificilmente
conseguirão romper as desigualdades e injustiças, como atestam as estatísticas
oficiais (BRASIL, 2004).
Apropriamo-nos da fala de Romão, para finalizar, ao lembrar
que o protagonismo de homens e mulheres negros/as é o determinante das lutas e
avanços do século XXI, e instigando a pesquisa para outras lutas, conquistas e
desafios contemporâneos.
Considerações
finais
A aprovação da Lei 10.639/2003 foi uma das conquistas do
movimento negro brasileiro, compreendendo a escola como um lócus adequado para
a compreensão das relações étnico-raciais e a transformação da sociedade. Após
séculos de construção de racismo e discriminação, a escola e seus professores
não podem permanecer indiferentes nem improvisar diante desse cenário. Não é
possível permanecer inerte diante da mentalidade racista e discriminadora, do
eurocentrismo, das relações étnico-raciais e sociais e da alienação dos
processos pedagógicos.
As Diretrizes Curriculares Nacionais iluminam nosso dever de
criar ações pedagógicas de combate ao racismo e às discriminações. Todo
educador deve ser um agente nessa luta. Ainda nas etapas de sua formação, o
professor deve ser qualificado para ser sensível e capaz de direcionar de forma
positiva as relações entre pessoas diferentes, para que aprendam a respeitar e
corrigir posturas, atitudes, palavras preconceituosas. É no docente em formação
que começa a compreensão da importância da diversidade étnico-racial, das
questões relacionadas a elas, e como lidar positivamente com elas e,
principalmente criar estratégias pedagógicas que auxiliem na reeducação.
A inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
e da educação das relações étnico-raciais se referem “a todos os brasileiros,
uma vez que devem educar-se enquanto cidadãos atuantes no seio de uma sociedade
multicultural e pluriétnica, capazes de construir uma nação democrática”
(BRASIL, 2004, p. 17), e a escola torna-se agente responsável pela derrubada
das formas excludentes. Os princípios que devem conduzir escolas e professores
são consciência política e histórica da diversidade, fortalecimento de
identidades e de direitos, ações educativas de combate ao racismo e a
discriminações, que exigem mudanças de mentalidade, pensamentos e ações de
indivíduos, instituições e culturas.
Referências
César Aquino Bezerra é Acadêmico do Curso de Licenciatura em
História da Universidade do Estado do Amazonas. E-mail: cesaraquinobezerra@gmail.com
AZEVEDO, Amailton Magno; LUCINDO, Willian Robson Soares.
Colonização europeia, escravidão e tráfico. In: CARDOSO, Paulino de
Jesus Francisco; RASCKE, Karla Leandro (orgs.). Formação de professores: produção e difusão de conteúdos sobre
história e cultura afro-brasileira e africana. 1. ed. Florianópolis: DIOESC,
2014. P. 140-153.
BRASIL. Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília:
Ministério da Educação/Secad, 2004.
CARDOSO, Paulino de Jesus Francisco; RASCKE, Karla Leandro.
Lei Federal 10.639/03, discussão de conceitos: multiculturalismo, diversidade,
ações afirmativas, racismo, preconceito, afrodescendente, negro, entre outros. In:
CARDOSO, Paulino de Jesus Francisco; RASCKE, Karla Leandro (orgs.). Formação de professores: produção e
difusão de conteúdos sobre história e cultura afro-brasileira e africana. 1.
ed. Florianópolis: DIOESC, 2014. P. 12-28.
MORTARI, Claudia; VIEIRA, Fábio Amorim. O Brasil dos séculos
XVI a XIX: populações de origem africana, cativeiro, identidades,
solidariedades, religiosidade e resistências. In: CARDOSO, Paulino de Jesus
Francisco; RASCKE, Karla Leandro (orgs.). Formação
de professores: produção e difusão de conteúdos sobre história e cultura
afro-brasileira e africana. 1. ed. Florianópolis: DIOESC, 2014. P. 167-183.
ROMÃO, Jeruse Maria. Os séculos XX e XXI: O caminho em
direção à igualdade. In: CARDOSO, Paulino de Jesus Francisco; RASCKE,
Karla Leandro (orgs.). Formação de
professores: produção e difusão de conteúdos sobre história e cultura
afro-brasileira e africana. 1. ed. Florianópolis: DIOESC, 2014. P. 225-242.
SIMÃO, Maristela dos Santos; BILÉSSIMO, Angelo Renato. Relações raciais na escola: currículo
e responsabilidades, livro didático, mídias e escola. In: CARDOSO,
Paulino de Jesus Francisco; RASCKE, Karla Leandro (orgs.). Formação de professores: produção e difusão de conteúdos sobre
história e cultura afro-brasileira e africana. 1. ed. Florianópolis: DIOESC,
2014. P. 43-59.
Diante da sua afirmação: "a aprovação da Lei 10.639/2003 foi uma das conquistas do movimento negro brasileiro, compreendendo a escola como um lócus adequado para a compreensão das relações étnico-raciais e a transformação da sociedade", pergunto: o que falta/faltou para concretização da Lei? Será que há/houve o interesse do Estado em materializá-la? Com capacitações e formação de professores/professoras.
ResponderExcluirKleyton,
ExcluirJá são quase 16 anos da assinatura da Lei 10.639/03. Infelizmente, há sérias deficiências na sua implementação. Creio que certamente a grande falha é do Estado. Minha universidade implantou a disciplina História e Cultura Afro-brasileira no curso de História há cerca de cinco anos. 10 anos após a Lei. Mas, estagiei em uma escola onde materiais que poderiam ser usados, inclusive livros didáticos, guardados na biblioteca, sem ninguém os tocar. Assim como presenciei professores que fazem o que está ao seu alcance para promover uma discussão, mas apenas na semana do 20/11.
Entretanto, as DCNs implicam e exigem a atuação de todos as esferas do governo, mas também a necessidade do envolvimento da sociedade. Parece, no que lamentamos, que a atual sociedade está se afastando desse debate.
César Aquino Bezerra
Uma realidade bem similar a que vivo, que nega de forma ampla a nossa diversidade. Obrigado e parabéns.
ExcluirCésar, primeiramente gostaria de parabeniza-lo pelo desenvolvimento do trabalho e as articulações realizadas no mesmo. Muito pertinente sua abordagem no tópico "pensando a escravidão". Com isso gostaria que, diante da publicação da lei que torna obrigatório o ensino de história da África e da cultura afro-brasileira,se possível você nos apesentasse uma melhor compreensão a respeito da discussão sobre escravidão que pode ser problematizada em sala de aula, visto que a própria compreensão de escravidão para os próprios africanos e posteriormente para os europeus era distinta, e diante disso, a abordagem em muitos casos torna-se lacunar sobre a temática, em alguns momentos reforçando estereótipos a respeito a escravidão.
ResponderExcluirGrato!
Edson Willian da Costa
Muito obrigado, Edson!
ExcluirAs próprias DCNs sugerem que tratemos o tráfico e escravidão no ponto de vista dos escravizados. Infelizmente, "revisionistas" e “somos todos humanos” gostam de citar a escravidão na África para diminuir o papel europeu e americano na escravização. Por isso, Azevedo e Lucindo, autores que usei, apresentam a escravidão que era presente no continente africano antes da colonização e do tráfico negreiro. Contudo, mesmo que presente em diversas culturas, a escravidão não tinha o mesmo sentido da definida pelos europeus. Os colonizadores alteraram o sistema de escravização com sua entrada no comércio de pessoas. Isso precisa ficar claro para todos.
Os autores definem três formas de escravidão nas sociedades africanas: escravismo incidental, onde a população escravizada é pequena, sua atuação é marginal, inclusive junto a outras pessoas livres; o escravismo institucional, das sociedades aristocráticas, onde escravizados eram frutos de guerra, sequestros ou punição por crimes; já o terceiro tipo, o modo de produção escravista, acontece quando se criam um sistema conectado de escravização, tráfico e uso interno dos cativos, com uma ligação entre escravização e comércio. Esse modo de produção escravista não é conhecido na África até a entrada dos europeus no comércio de escravos.
Ou seja, até então, a escravização não era causa, mas subproduto. Além disso, a escravidão nas sociedades tradicionais tinha regras diferentes do tráfico escravista, inclusive com a possibilidade de inclusão do escravo estrangeiro à linhagem dos senhores, ainda que, obviamente, haja violências.
E, reforçando a luta contra os estereótipos, creio ser pertinente seguir a abordagem de Azevedo e Lucindo, ao privilegiar as vivências e formas de resistência dos escravizados ao trabalhar o tráfico, para desfazer a imagem de vítimas indefesas, e compreender os escravizados como agentes históricos.
César Aquino Bezerra
Obrigado pelas considerações César.
ExcluirGrande abraço.
ATT
Edson Willian da Costa
Olá ! Gostaria de parabenizar pelo trabalho. Minha pergunta a respwres do tema de relações étnico-raciais é sobre a criação de ações pedagógicas para o combate ao racismo. Qual sua opinião acerca do uso das artes cênicas em específico a dança afro para o debate de relações étnico-raciais? E se possível qual sua posição a respeito de uma disciplina de formação artística para o professor em formação para trabalhar tal tema?
ResponderExcluirAtt,
Felipe Araújo de Melo.
Obrigado, Felipe!
ExcluirAs DCNs incentivam que as discussões sobre a História e Cultura Afro-brasileira atravessem a disciplina de Artes nas escolas. Certamente, é necessário e um campo muito rico. Bem como em outros espaços em que as artes são apresentadas. Quanto à disciplina, com certeza creio seria um meio eficaz para a formação de professores, especialmente nas áreas de Artes e Pedagogia.
Porém, me vem uma preocupação. Com o crescente conversadorismo da sociedade brasileira, muitos professores e pais se mostrarão contrários à manifestações de artes de origem africana nas salas de aula e escolas. O que é uma pena.
César Aquino Bezerra
Primeiramente parabenizo pelo excelente texto.
ResponderExcluirSobre a lei 10639/03, não há que se negar ser uma grande conquista. No entanto, a lei nos livros didáticos só foi efetivada em 2013 pelo PNLD 2015, alegando que os profissionais envolvidos necessitavam de capacitação. Até aí tudo bem, mas passado o tempo, ainda há problemas, por exemplo, em se falar da mitologia e religiões de matriz africana, do sincretismo com o catolicismo, etc. Como desmistificar e realmente propagar esses conceitos atualmente? Outra questão é sobre a interdisciplinaridade, visto que Machado de Assis, por exemplo, ainda é retratado como homem branco nos livros de literatura, não que isso seja afirmado, mas não se fala que era um afrodescendente.
Um último apontamento é sobre o atual PNLD que foi suspenso, a primeira retificação após o início do novo governo, desobrigava as editoras a se preocupar em estereotipar a imagem do negro. Como agir em sala de aula à revelia disso, correndo riscos de ser rotulado?
Heitor, obrigado!
ExcluirEntendo sua preocupação. Lembro do livro infantil da Dra. Kiusam Oliveira, sobre princesas africanas, que sofreu boicote de pais em uma escola. É um desafio para qualquer docente tratar de mitologias/religiões de matriz africanas, já que enfrentamos um crescente avanço de setores conservadores.
Minha reação às suas três questões seria a mesma: o papel do professor. Cada professor deve assumir uma posição de enfrentamento desse racismo institucionalizado e ser um canal para essa mudança, mesmo que governos e indivíduos sejam contrários. É preciso ser anti-racista, mesmo que isso traga problemas para si. Ser o meio para desmitificar esses conceitos, levar a literatura nacional, desfazer esterótipos, questionar essas imagens, ainda que os livros só pensem no negro escravo e em brancos sorridentes. Infelizmente, os atuais tempos não nos ajudarão nessa luta. Não podemos desistir.
César Aquino Bezerra
Bom Dia!
ResponderExcluirA Lei 10639/2003 ainda é um aporte para introdução dos temas atinentes a população afro-brasileira e africana, no entanto a Lei foi de certa forma verticalizada por conta da falta de preparação aos professores que não tem embasamento para trabalhar os conteúdos, sem contar o distanciamento que há entre currículo e estes temas, ao tempo da obrigatoriedade não tivemos avanços, com base nisto como sugere desenvolver esta temática em sala de aula.
JÊIBEL MÁRCIO PIRES CARVALHO
Jêibel, realmente temos inúmeros problemas a resolver. E continuo defendendo a atuação do professor, que se tornou consciente das diversidades, como agente nesse processo de desenvolvimento da temática. As DCNs oferecem alguns aportes, mas, dentro do meu limite, uso como exemplo o trabalho com os reinos africanos, desconhecidos da maioria da população. Aliás, nem o Egito Antigo é percebido como África na maioria das vezes. Continuando, não é possível assegurar que o livro didático trará um capítulo sobre as civilizações africanas, mas, creio que o professor deve apresentar esse tema ainda assim, ao menos comparando, inserindo o tema em outras discussões. Vide: "as universidades europeias surgiram em determinado período da Idade Média europeia, mas não foi só lá; haviam universidades também na África", e então apresenta Timbuktu, mesmo que o livro nem saiba dela. Creio que outras situações podem ser pensadas.
ExcluirPor isso, argumento que nós precisamos ler mais livros sobre as africanidades, buscar conhecimento, para poder compartilhá-lo e instigá-lo, mesmo que as circunstâncias escolares sejam adversas.
César Aquino Bezerra
Ótima abordagem e necessária, novos parâmetros curriculares são de extrema necessidade, visando séculos que deixamos de tratar corretamente sobre estes em sala de aula. Sendo assim, com a visível demora para a aplicação da Lei 10639/2003, que caminhos atualmente o educador pode acessar para adequar seu currículo? Sendo relatado a falta de projeto de integração em diversos Estados no Brasil.
ResponderExcluirATT,
Danielle Neri Marinho.
Danielle, obrigado!
ExcluirNossas dificuldades são inúmeras, que vão desde as esferas dos governos ao crescente conservadorismo. Já usei acima o exemplo da censura ao livro da Dra. Kiusam de Oliveira em uma escola fluminense, mas, ainda que seja difícil, isso não pode parar o professor. É possível encontrarmos brechas para apresentar esses conteúdos, seja em História, Artes, Literatura, etc. Por isso, continuo defendendo que nós, professores, precisamos ler mais livros sobre as africanidades, buscar conhecimento, para poder compartilhá-lo e instigá-lo, mesmo que as circunstâncias escolares sejam adversas.
César Aquino Bezerra
Boa tarde!
ResponderExcluirPrimeiramente gostaria de parabenizá-lo pela pesquisa e gostaria de saber se por meio dos seus estudos a partir da implementação da lei 10639/2003, se foi possível observar avanços na formação dos professores sobre essa temática? E como pode ser trabalhada essa temática na Educação Infantil?
Obrigado, Amanda!
ExcluirTomando como exemplo minha universidade, a disciplina de História e Cultura Afro-brasileira foi implantada há cerca de cinco anos. Pouco tempo, com várias turmas formadas antes sem esse foco. Não sei comentar sobre o resto do Brasil, mas creio que os desafios devem ter sido muitos também. Porém, o livro referência para a escrita desse artigo é um exemplo de como bons materiais tem sido produzidos e podem alcançar muitos mais.
Quanto à Educação Infantil, a escola e os docentes devem desde logo apresentar às crianças a riqueza desse universo de diversidades que é o Brasil. Se os outros tentam uniformizar tudo, nós devemos ser agentes da multiplicidade. Isso incluiria não permitir/perpetuar racismos institucionais, depreciação de roupas/estilos afros, uso de histórias/lendas africanas, etc. Creio nos professores; somos capazes de propôr uma educação transformadora.
Att, Amanda Pereira de Lima.
ResponderExcluirBoa tarde, é bem pertinente a sua abordagem, gostei muito do seu texto, é levando em consideração as dificuldades encontradas no processo de ensino sobre o tema mesmo com a obrigatoriedade perante a lei, como as escolas e os docentes podem adequar o currículo e a prática diante da dificuldade e demora no processo de aplicabilidade da lei, em sala de aula?
ResponderExcluirGrato
Matheus França dos Santos
Obrigado, Matheus! Bem, temos as DCNs, materiais diversos, cursos, pessoas especializadas, que têm trabalhado currículos e práticas para a aplicação da Lei 10.639/03. Apesar de lei, não tem alcançado a maioria da educação brasileira adequadamente, e certamente a passividade de escolas e docentes contribuem para isso. Não saberei identificar realmente ações que mudariam essa realidade a um grande nível, mas creio que cada professor, especialmente nós da História, devemos tentar de todas as formas trazer aos nossos universos locais, e até municipais e regionais, mudanças nesse quadro. Desde inserir as Áfricas nos conteúdos de História, Artes e Literatura, até semanas de qualificação específicas para professores de uma escola ou de uma cidade. Não importam as barreiras, é um dever nosso tentar. Considero que doar o livro organizado pelo Prof. Paulino de Jesus Cardoso para docentes, já é um começo.
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