O
FUTURO DO ENSINO DA HISTÓRIA INDÍGENA NO BRASIL: ANTIGOS PROBLEMAS, NOVOS
DESAFIOS
Considerações Iniciais
O presente texto
pretende apresentar algumas discussões pertinentes ao ensino da temática
indígena no Brasil, sobretudo no que diz respeito às questões relacionadas aos
antigos e novos dilemas. Não tenho com isso a pretensão de apresentar uma
suposta fórmula mágica, para situações que requerem discussões e reflexões
muito mais profundas, contudo, acredito que algumas ideias apresentadas neste
texto, poderão causar reflexões pertinentes em discentes, docentes,
pesquisadores e público em geral, se isso acontecer, meu papel já estará
parcialmente cumprido.
Percalços da Lei
Embora vários
docentes orientados pela Lei 11.645/08 já desenvolvam atividades em sala de
aula com a temática indígena, os desafios que se apresentam estão apenas no
início. Isso pode ser entendido sob dois aspectos importantes, o primeiro a
partir da educação básica formal, onde crianças e adolescentes indígenas
precisam se adaptar ao mundo do branco. Já no segundo, o desafio é ainda maior,
pois parte do próprio modo de vida tradicional.
A esse respeito, Roberto
Cardoso de Oliveira (1964), nos ajudou a entender um pouco dessa complexa
situação, quando ele analisou o caso dos índios Tikuna na região do Alto
Solimões no Amazonas. Partindo deste pressuposto, urge salientar, o
imprescindível papel da Antropologia para o entendimento de tais questões,
sejam elas do ponto de vista tradicional, jurídico e, principalmente, com o imbricamento
histórico.
Questões do Tempo
Mas cabe ao
historiador o papel de analisar e tentar dar um significado a essa relação
passado, presente e futuro. Isso nada mais é do que o poderíamos chamar de uma
história dos conceitos. Sobre isso, corroboro com a ideia de Reinhart Koselleck
(2006), que nos aponta para uma análise semântica a partir das experiências.
Isso pode ser
compreendido, tendo como base algumas inferências do próprio autor, como
podemos observar seguir, “[...] entre experiência e expectativa, constitui-se
algo como um tempo histórico” (KOSELLECK, 2006, p. 16). Não obstante, Paul
Ricoeur (2007), nos faz refletir sobre tais premissas, tomando como aporte
questões relacionadas à memória, experiência, narrativa e tempo.
Quando eu recorri a
tais pressupostos teóricos para compreensão desses conceitos, a intensão além
de interpretá-los, é trazê-los à luz do tempo presente, porém, com um cuidado
redobrado para não cometer o pecado do anacronismo.
Dito isto, volto-me
agora à problemática da construção desta teia, para tentar elucidar ao leitor
alguns pontos que por ora apresento-lhes, tomei a liberdade de recorrer a
Michel De Certeau (1982), desta feita, lhe parafraseando em sua operação historiográfica,
à medida em que o autor explicita a necessidade de trabalhar de maneira
significativa a relação entre teoria e prática, além de discorrer sobre isso no
cotidiano.
Portanto, para
entendermos determinados conceitos, principalmente os que estão relacionados à
história indígena (mas também que é eficiente para outras categorias de
análises). O historiador deve ter a dimensão da importância da parceria com a
Antropologia, além das noções conceituais, teóricas e metodológicas citadas
acima.
O Índio não é o Problema
O índio nunca causou
problema algum! Resolvi começar este parágrafo com essa frase, para alertá-los
sobre a maneira que determinados veículos de comunicação se referem aos povos
tradicionais. Todavia isso ocorre desde os tempos coloniais, como bem sabemos.
Portanto, faz-se
necessário a ampliação dessa visão e o aprofundamento dessa questão, pois os
povos indígenas não são “causadores de problemas”, o que existe de fato é uma
“questão indígena”, que deve ser amplamente discutida pelas autoridades
competentes e sociedade civil, tendo como condição primordial o respeito às
lideranças e a autodeterminação dos mesmos.
Ensino da Temática indígena e Protagonismo
Eu poderia entrar
aqui no mérito de muitas questões, pois esse assunto abre um leque de
possibilidades, contudo, volto-me agora a questão central da discussão que me
proponho a fazer nesse breve texto, voltada para o ensino da temática indígena.
Após alguns anos de análises e pesquisas, irei apresentar-lhes alguns avanços
significativos acerca do tema.
Não pretendo por
ora incluir-me neste seleto grupo, apesar de também investigar e me interessar
por essas questões, meu objetivo é evidenciar aqui tanto autores que já se debruçaram
no assunto com uma maior propriedade, quanto os excelentes autores indígenas,
que brilhantemente conseguem evidenciar com maestria e autonomia a situação em
que se encontra o ensino da história indígena.
Iniciarei me
debruçando brevemente pela obra da Professora Luísa Tombini Wittmann (2015), ao
passo que concordo com o seu ponto de vista quando ela “[...] revela o desconhecimento
de nossa sociedade sobre a própria história” (WITTMANN, 2015, p. 9).
Infelizmente essa percepção em grande parte se aplica ao tanto ao passado,
quanto ao presente, no que se refere à maneira como equivocadamente os povos
indígenas foram “tratados” (perseguidos, aprisionados, escravizados, entre
outras barbaridades), e representados, na maioria das vezes como indolentes,
aparecendo na Literatura, na própria história e irresponsavelmente nos livros
do MEC desta forma.
Porém, com a
reformulação de parte da nossa obsoleta legislação educacional, sobretudo a
partir da década de 1990 com a implantação da LDB (Lei 9.394/96), novos
paradigmas surgiram, que proporcionaram avanços plurais nesta área específica,
como podemos observar no caso da criação dos Parâmetros Curriculares
Nacionais-PCN. É a partir daí que termos como “pluralidade e diversidade”
começaram a ser agentes norteadores do novo PCN, isso de fato acabou
contribuindo muito para a criação das Leis 10.639/03; 11.645/08 e 12.288/10.
No entanto, a
preocupação com o ensino da temática indígena é anterior a década de 1990, um
dos percussores foi Bartolomeu Melià (1979), que já nos chamara a atenção
naquela época para importância e o impacto que a educação indígena poderia
proporcionar à sociedade nacional nas próximas décadas. Esse debate se
aprofundou com nomes de peso que discutiram o ensino da história indígena no
cenário nacional, como nos casos de Aracy Lopes da Silva, na década de 1990 e
em uma fase mais atual, com o Prof. Dr. Edson Hely Silva (UFPE) e Prof. Dr.
Mauro Cézar Coelho (UFPA).
Essas discussões
foram trazidas mais recentemente para o universo da sala de aula pelo próprio
Edson Silva (2015), a partir de uma experiência de pesquisa, desenvolvida por
ele e por uma orientanda sua do Ensino Médio no Colégio de Aplicação da UFPE,
entre os anos de 2011 e 2013. O objetivo principal foi analisar como o índio é
representado nos livros didáticos do MEC, através do Programa Nacional do Livro
Didático (PNLD).
De fato, isso
também me causa bastante inquietude, não só pela forma em si que ocorre essa
representação, como se o indígena fosse apenas “um elemento exótico e
subserviente” tal como por vezes ele sempre aparece. Mas urge a necessidade
para o historiador de evidenciar justamente o contrário disso, exaltando o
protagonismo, a resistência e autodeterminação dos povos tradicionais.
Por outro lado,
quando passamos a observar este protagonismo emergente a partir da ação dos próprios
índios, descortinou-se uma série de autores que evidenciam em suas pesquisas e
trabalhos as suas vivências, experiências e apontam para a valorização de uma
etno-história, com ênfase em diversos aspectos da cultura do seu próprio povo,
trazendo à tona além do ensino, questões relacionadas à cosmogonia, cosmologia,
identidade e parentesco.
Sobre a leva dessas
novas lideranças e autores, podemos destacar nomes como: Gersem José dos Santos
Luciano (do povo Baniwa), Davi Kopenawa (do povo Yanomami), Ailton Krenak e
Daniel Munduruku, responsáveis em grande parte, pelo sucesso que a nova
história indígena vem alcançando no que se convencionou chamar de “História
Indígena do Tempo Presente”.
Entre
Paul Veyne e John Monteiro
Aparentemente essa relação do subtítulo
acima que eu lhes apresento pode parecer aos olhos mais atentos um possível
“ato falho” da minha parte, no entanto, no caso do primeiro autor, apenas o
utilizo como paráfrase, e tomo-lhe emprestado de forma genérica o título de um
dos seus mais conhecidos livros, chamado: “Como se escreve a história” (1983)
[1971]. A minha ousadia vai mais além e inverto o sentido da frase, colocando
uma interrogação no final e acrescento alguns elementos para finalmente fazer a
analogia necessária que eu tanto queria, senão vejamos: “Como se escreve a
história indígena”? Como se escreve essa história indígena a partir da visão
dos próprios índios?
Para responder esta pergunta eu recorrerei
ao segundo autor acima que vos apresento, trata-se de John Manuel Monteiro, que
durante a sua trajetória nos deixou um legado superlativo na História, na
Antropologia e na Etno-História. Nos possibilitando assim compreendermos o
lugar e o papel do índio ao logo desses mais de cinco séculos de história. A
esse respeito ele comenta:
“Este quadro vem mudando graças ao esforço crescente – sobretudo de antropólogos, porém também de alguns historiadores, arqueólogos e linguistas – que tem surgido em anos recentes em elaborar aquilo que podemos chamar de uma “nova história indígena”. Deve-se observar, de imediato, que o tema não é nada novo nem para a historiografia, que desde o século XIX enfocou o índio Tupi como matriz da nacionalidade, nem para a etnologia indígena, que construiu uma parte importante de seu edifício nos alicerces colocados por Alfred Métraux e por Florestan Fernandes, que se valeram das fontes escritas nos séculos XVI e XVII para elaborarem sofisticados modelos para as sociedades tupi-guaranis”. (MONTEIRO, 2001, p. 7).
É válido salientar, que os apontamentos que
foram levantados na obra de John Monteiro, me levaram a refletir acerca da
importância da valorização dessa etno-história.
Impressões,
Experiências e Lembranças de um Historiador Etnólogo
Aqui tomarei à liberdade de colocar um
pouco das minhas impressões sobre tema, haja vista que antes disso, procurei
evidenciar ao longo do texto autores indígenas e não-indígenas que dispõem de uma
maior envergadura no tema do que eu, apesar de parecer pretensioso da minha
parte esse tipo de autoclassificação que me refiro acima, mas a minha intenção
é apenas passar alguns relatos de experiências e relembrar outros tantos
momentos que tive ao longo desta jornada.
Após às devidas justificativas, retorno ao
tema principal, e faço como dissera João Pacheco de Oliveira (2004) “A viagem
da volta”, para o ano de 2010, quando comecei a aprofundar minhas leituras e
pesquisas na história indígena e do indigenismo. O pontapé inicial, deu-se na
Universidade Federal de Pernambuco, à época, tive os primeiros contatos com
vários textos clássicos, ainda como aluno especial do Mestrado em História, em
uma disciplina ministrada pelo Prof. Dr. Edson Hely Silva.
O primeiro contato de fato que tive com um
povo indígena, foi a partir de uma visita que fizemos neste mesmo ano de 2010 à
Serra do Ororubá, no município de Pesqueira-PE, onde habita o povo Indígena
Xukuru. Lá tive a oportunidade após a autorização das lideranças, de visitar o
túmulo do Cacique Chicão, morto por causa de conflitos fundiários.
Essa experiência me marcou muito, e a
partir dali, debrucei-me com afinco na pesquisa da história indígena do tempo presente,
soma-se a isso, outras experiências exitosas junto aos índios Sateré Mawé no
Amazonas, Tikuna, também no Amazonas, além da profunda pesquisa que realizei
sobre o genocídio indígena do povo Waimiri-Atroari, que além de ser tema da
minha Dissertação de Mestrado, defendida na Universidade Federal do Amazonas em
2015, também desdobrou-se em um livro e alguns artigos publicados.
Após a minha entrada como Professor na
Universidade Federal de Roraima em 2017, venho me debruçando sobre o povo
Yanomami, mas a pesquisa em si é complicada e arriscada, pois existem por trás
outros interesses variados, muitos deles de cunho político, ou ligados direta
ou indiretamente a ação de grileiros, posseiros, madeireiros, mineradores e,
principalmente, garimpeiros.
Sendo assim, o que esperar do futuro tanto
do ensino, quanto da própria história indígena em si? Com essa pergunta não
quero parecer pessimista aos olhos do leitor, mas você que está lendo esse
texto agora, nesse exato momento, qual a sua impressão? Deixarei aqui esse
questionamento, pois a minha intenção não é e nem será produzir respostas
prontas com esse texto, mas gerar algumas reflexões em quem se dispuser a ler.
Considerações
Finais
Procurei nesse texto não tentar trazer
soluções, até mesmo porque eu não as tenho, e talvez nunca as terei, mas por
outro lado, também procurei percorrer uma trajetória por alguns caminhos
possíveis, tentando estabelecer laços entre o passado e o futuro, mas sem
esquecer das aflições do presente.
No âmbito do ensino, eu procurei trazer à
tona de uma maneira breve algumas mudanças que ocorreram ao longo das últimas
décadas na legislação educacional brasileira e que impactaram de forma direta
ou indireta o ensino da história indígena no país.
Procurei estabelecer uma ligação pertinente
entre a história e o tempo, além de ratificar o importante papel que a Antropologia
exerce para o entendimento de determinadas relações culturais, políticas,
jurídicas, históricas e afins junto aos povos tradicionais.
Por algumas vezes, fiz uso de algumas
figuras de linguagem, para expressar determinadas situações e circunstâncias,
em uma tentativa de equilibrar o texto, com o seu natural impacto de realidade
que eu espero que ele alcance.
Em síntese, gostaria que esse texto fosse
algo agradável aos olhos do leitor, e até recomendável com uma xícara de café,
e que a mensagem chegasse de uma forma suave, porém marcante...
Referências
Eduardo Gomes da
Silva Filho é Professor da Universidade Federal de Roraima, Campus Murupu.
Mestre em História Social pela Universidade Federal do Amazonas e Coordenador
do Curso Superior de Tecnologia em Agroecologia da UFRR.
BRASIL. Lei 10.639/2003, de 9 de janeiro de 2003.
Altera a Lei nº 9. 394, de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial da União,
Poder Executivo, Brasília.
BRASIL. Lei 11.645/08 de 10 de março de 2008.
Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília.
BRASIL/MEC. Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, DF: 20 de dezembro de
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BRASIL. Lei nº 12.228, de 20 de julho de 2010.
Dispõe sobre o Estatuto da Igualdade Racial. Diário Oficial da União, Poder
Executivo, Brasília.
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Ao pensar sobre o ensino nas escolas, devemos também pôr em pauta o ensino nas universidades e a formação acadêmica que o professor/historiador recebe para lecionar. Cabe ao professor do ensino básico saber mediar à relação entre a visão histórica que os autores apresentam em seus livros e a concepção de sociedade que os alunos carregam, colocando em prática a teoria adquirida durante a graduação, desvencilhando-se de estereótipos consolidados em relação à história. Ao trabalhar com uma história interdisciplinar, como no caso da história indígena que ultrapassa as fronteiras disciplinares tradicionais (envolvendo conceitos antropológicos, como apontado no texto), o professor deve se atentar ainda mais para esses elementos reproduzidos quase mecanicamente que causam uma simplificação etnocêntrica da realidade das populações indígenas.
ResponderExcluirJá tive a oportunidade de analisar a questão da história indígena em alguns livros didáticos distribuídos na rede pública do estado de São Paulo e infelizmente essa imagem das populações nativas do continente Americano como “exóticas e subservientes” é recorrente em muitas obras. Nesse sentido, gostaria de saber a opinião do autor sobre a importância que os cursos universitários de licenciatura e bacharelado dão sobre a questão indígena na formação dos graduandos e como isso se reflete nos livros didáticos.
Bruno Tomazela Pasquali
Olá Bruno, boa tarde! Durante as duas últimas décadas o ensino da história indígena vem passando por uma transformação significativa, contudo, mesmo com o esforço de professores, pesquisadores e de alunos, que se debruçam, debatem e publicam acerca da temática, ainda há uma enorme distância do ideal, pois o atual cenário ainda reflete uma herança colonial, eurocêntrica e positivista ainda muito forte. Nas Universidades públicas o quantitativo de matrículas também é ainda muito desigual, no que se refere a alunos indígenas e não-indígenas. Já na rede particular, falta nitidamente políticas públicas, já que nas Universidade públicas as políticas afirmativas se apresentam como um atenuante, mas infelizmente está longe de ser a solução. Todavia, a maneira como o índio ainda é representado nos livros didáticos, sobretudo nos do próprio MEC, são reflexos em parte, da nossa própria sociedade, que ainda os vê parcialmente desta forma, isso por vários motivos, entre eles podemos destacar a utopia da classe média, a excentricidade e o monopólio do poder dos ricos, e a falta de instrução (proposital pelo sistema), dos mais pobres.
ResponderExcluirSendo assim, como você colocou, é de fundamental importância o efetivo cumprimento da lei no ensino, tanto na educação básica quanto no ensino superior. Essa maior intensidade, poderá em um futuro próximo, diminuir o abismo atual entre os índices de formandos nas Universidades, além da necessária mudança de paradigma em relação ao olhar para os povos tradicionais. Contudo, é válido salientar, que a evidenciação da alteridade pelos próprios grupos étnicos, é um grande avanço para diminuir essas diferenças.
Prof. Eduardo Gomes.
Caro Professor Eduardo Gomes, saudações cordiais...
ResponderExcluirEm primeiro lugar, agradeço pela oportunidade de leitura deste texto. Em seguida, gostaria de apresentar algumas reflexões sobre a questão que sugeres ao longo de teu texto.
Sobre o futuro da questão indígena e, mais diretamente, o futuro da escrita da história indígena contemporânea, lembro que um importante trabalho nessa direção foi organizado por Aracy Lopes da Silva e Luis Donizete Benzi Grupioni e publicado em 2004. Intitulado "A temática indígena na escola" a coletânea traz um texto importante escrito por John Manuel Monteiro intitulado "O desafio da História Indígena no Brasil". Este texto me parece importante para, justamente, refletirmos sobre os rumos da história indígena. Nele, John Monteiro observou que
"A historiografia brasileira, ao longo das últimas duas décadas, tem buscado incorporar grupos sociais antes ignorados pela bibliografia. ao mesmo tempo, abordagens antropológicas têm penetrado diversas áreas de investigação histórica, abrangendo estudos sobre a inquisição, a escravidão, as relações de gênero, as mentalidades, entre tantos outros assuntos. Diante deste quadro, contudo, é de se estranhar a pouca atenção dispensada aos povos indígenas pelos historiadores. Com exceção de poucos estudos, parece prevalecer, ainda hoje, a sentença pronunciada pelo historiador Francisco Adolfo Varnhagen, na década de 1850: para os índios 'não há história, há apenas etnografia'" (Monteiro, 2004, p. 221).
Continuando...
ExcluirApesaro disso, John Monteiro (2004, p. 228) também observou que apesar dessa lentidão no desenvolvimento de uma historiografia que privilegie o protagonismo indígena há, por outro lado, o desenvolvimento de uma historiografia indígena, conforme você também aponta neste texto, que se constitui em contraponto às narrativas historiográficas desenvolvidas até anos recentes e que resulta, especialmente, de trabalhos desenvolvidos, muitas vezes, pelos próprios intelectuais indígenas. Nas palavras de Monteiro:
"A extinção dos índios, tantas vezes prognosticada, é negada enfaticamente pela capacidade das sociedades nativas em sobreviver os mais hediondos atentados contra sua existência. Recuperar os múltiplos processos de interação entre essas sociedades e as populações que surgiram a partir da colonização europeia, processos esses que vão muito além do contato inicial e dizimação subsequente dos índios, apresenta-se como tarefa essencial para uma historiografia que busca desvencilhar-se de esquemas excessivamente deterministas. Com isto, páginas inteiras da história do país serão reescritas; e ao futuro dos índios, reserva-se-á um espaço mais equilibrado e, quem sabe, otimista".
Nesse sentido, considero que a questão que colocas é de extrema importância para se pensar o modo como temos escrito e ensinado história indígena em nossas salas de aula desde a Educação Básica ao Nível Superior.
Assim, concordando com suas análises, dos autores que citas e com as citações a John Monteiro, acredito que é somente a partir de uma diálogo mais íntimo entre a História e a Antropologia é que se tornará possível fortalecer uma historiografia que privilegie o protagonismo indígena desde a Colônia ao Mundo Contemporâneo.
Nesse sentido, aproveito a ocasião para perguntar de que modo torna-se possível estabelecer um diálogo interdisciplinar entre Antropologia e História que possa privilegiar a evidenciação do protagonismo indígena. Dito de outro modo, como podemos trabalhar questões que permitam àqueles que poderíamos denominar de historiadores-antropólogos uma análise que privilegie as ações empreendidas por sujeitos e coletivos indígenas como estratégias de sobrevivências fundamentais a manutenção de suas tradições?
Agradeço antecipadamente pela resposta...
Forte abraço!
Fernando Roque Fernandes
Universidade Federal do Pará (UFPA)
Olá, Professor Eduardo Gomes. Queria parabenizá-lo pela rica contribuição textual.
ResponderExcluirÉ importante ressaltar os diferentes espaços historiográficos e associar com a política educacional no que tange a temática indígena. Mas não só. Também é interessante que as experiências pessoais sejam compartilhadas em tópicos que trabalham com as perspectivas de alteridade e de antropologia – como foi feito pelo senhor.
Gostaria de saber mais sobre a sua opinião, de forma breve, a respeito do panorama da história indígena endógena, escrita pelos próprios pertencentes aos grupos étnicos, e as tensões (e as principais contribuições) que estes enfrentam em relação a uma estrutura europeia incapaz de abarcar as diversificadas formas de conhecimento/visões de mundo.
Att, Filipe Barbosa.
Bom dia Filipe, é bom saber que o texto está alcançando leitores em outras regiões e atravessando determinadas fronteiras. Como você bem percebeu, é importante para o historiador socializar essas experiências com o mundo acadêmico e a sociedade civil. Já no que diz respeito à prática "endógena" dos grupos étnicos, isso perpassa por uma série de fatores, que variam de acordo com a cultura, organização, alianças, interesses, participações individuais e coletivas (principalmente no campo político), etc. Entre essas ações, destaco a atuação das chamadas "Agências indígenas", como formas de articulação, organização e resistência destes povos. Por outro lado, como você também observou, tensões e conflitos não são incomuns, muito pelo contrário, tanto de maneira endógena, como exógena, às vezes por questões referentes ao próprio grupo étnico, às vezes (ou na maioria delas), por pretensões ligadas ao agronegócio, grilagem e questões políticas. Outrossim, o papel da nova história indígena nesse contexto, se apresenta como um divisor de águas, que busca romper com a historiografia tradicional acerca desses povos. Fraterno abraço!
ExcluirProf. Eduardo Gomes/UFRR.
Prezado professor Fernando Fernandes, é sempre uma grande satisfação para mim quando você lê algum texto meu, sempre aprendo algo novo com você, um dos promissores historiadores da nova geração que analisa com muita eficiência a história indígena. Em relação a sua pergunta, essa nova história indígena, se caracteriza a partir de um aprofundamento maior entre a História e Antropologia, de fato trata-se de uma abordagem com um viés histórico, que trata da presença dos índios na história do Brasil, estabelecendo esse diálogo com a Antropologia e a Etnologia, possibilitando a partir dessa interdisciplinaridade, uma nova leitura da presença das populações indígenas na história do Brasil.
ResponderExcluirPor outro lado, como você bem colocou, o papel dos historiadores e dos antropólogos, são de significativa relevância neste processo, contudo, os fatores relacionados às ações dos próprios grupos étnicos, tais como a alteridade, o protagonismo e a autodeterminação, estão a cada dia vindo à tona com maior intensidade, colocando esses grupos em uma posição de evidência política, educacional, econômica e social, que até poucas décadas atrás não tinham. Dito isto, depreende-se que apesar do papel de agentes externos, os próprios indígenas estão ocupando espaços importantes na sociedade, a partir de ações coordenadas, que envolvem experiência, organização e, principalmente, resistência!
Prof. Eduardo Gomes/UFRR.